Prêmio MCTI-FINEP de Biodiversidade

Autor: Enio Giuliano Girão

Catálogo polínico, inventário florístico e produção de mel em Marcelino Vieira, Rio Grande do Norte, Brasil

A Caatinga abriga 94 espécies de abelhas e 318 de plantas endêmicas, o que nos estimulou a construir, a várias mãos, um catálogo polínico, inclusos o inventário florístico e a avaliação da produção de mel de espécies vegetais nativas e introduzidas usadas como fonte de néctar e pólen pelas abelhas. O documento apresenta rico detalhamento das condições socioambientais do município de Marcelino Vieira, destaque na produção de mel no Rio Grande do Norte. O diferencial são as ilustrações de hábito, flores, e grãos de pólen (a digital da espécie vegetal), que têm abertura, ornamentação, estratificação e aspectos gerais com imagens de qualidade, contribuindo para sua identificação botânica em amostras de produtos apícolas e geossedimentos. São descritas 79 espécies vegetais, demonstrando a rica diversidade de nativas da Caatinga. Cada página é uma prancha de identificação dos indivíduos, num mosaico de 29 famílias de importância regional na disponibilidade de néctar ou pólen para as abelhas. Há destaque para 24 espécies de leguminosas (Fabaceae), que compõem um terço da lista. Os indivíduos utilizados nas descrições estão registrados no Herbário Prof. Francisco José de Abreu Matos, da Universidade Vale do Acaraú (UVA), com o respectivo número no acervo, e a palinoteca está depositada na coleção da Universidade Federal do Ceará (UFC). Isso dá confiabilidade aos estudos e possibilita dirimir dúvidas de identificação botânica ou mesmo descrição morfológica. A publicação oportuniza aos leitores compreender o potencial dos serviços ecossistêmicos gerados pela polinização, em termos de manutenção, recuperação ou melhoria das condições ambientais. O Catálogo tem chancela editorial da Embrapa, publicado na Série Documentos, que é um avalizador da qualidade de seu conteúdo. A editoração gráfica suave torna sua leitura prazerosa e de fácil manuseio na lida laboratorial ou em campo.

Impacto social – melhoria na qualidade de vida da população/número de pessoas atingidas/beneficiadas

Deste movimento, liderado pela Embrapa Agroindústria Tropical, participaram 40 apicultores locais, além de representantes da Prefeitura Municipal de Marcelino Vieira, Emater/RN, UVA, UFC, USP, Geospace e Cooperativa Agroindustrial de Agricultores Familiares de Marcelino Vieira (COAAF). A publicação traz metodologia, mapas, imagens e outros resultados do levantamento florístico de interesse apícola (Apis mellifera), parceria entre apicultores, pesquisadores e técnicos, e atende às demandas das famílias e ao planejamento apícola municipal. A pesquisa em agrobiodiversidade continua gerando ativos sociais. Seus dados estão sendo úteis para apicultores e aqueles que lidam com estudos de interação abelha-planta, nos princípios da Etnobotânica. Estima-se 400 pessoas envolvidas. Os resultados ganharam destaque em eventos, como o Seminário de Apicultura do Alto Oeste Potiguar (IFRN Pau dos Ferros) e a Festa do Boi (Sebrae, Parnamirim), ambos em 2017, com 120 e 300 participantes, respectivamente, e divulgação na mídia local (rádios), TV Metropolitano, sites da Embrapa e da Rede de Catálogos Polínicos Online (RCPol).

Impacto em geração de riqueza – faturamento / produção

O catálogo polínico trouxe ampla divulgação sobre quais espécies devem ser manejadas no entorno dos apiários, de forma que essas áreas sejam mais produtivas e garantam a qualidade do alimento para as abelhas e a dos produtos apícolas para alimentação humana. A metodologia, voltada aos apicultores e à produção de mel, tem alcançado outras áreas da ciência relacionadas à alimentação das abelhas africanizadas e das espécies nativas no Nordeste, como melipônias (abelhas sem ferrão). As informações da publicação e dos estudos seguintes têm auxiliado na produção de frutíferas, hortaliças e de espécies nativas usadas na alimentação local. Isso ocorre porque, ao se manter as espécies de plantas apresentadas no estudo no entorno das áreas de produção, aumenta significativamente a atratividade e melhora a manutenção das abelhas, contribuindo para polinização e produção de sementes e frutos. A produção local de mel de abelhas passou de 3 mil kg, em 2015, para 16,7 mil kg, em 2020 (IBGE, 2021), cuja evolução em parte se deve à construção coletiva de conhecimentos, superando anos de escassez hídrica na região.

Qualidade do envolvimento de atores da sociedade /ecossistema de inovação (comunidades, empresas, demais institutos de pesquisa) no trabalho realizado e nos prováveis desdobramentos

Os processos foram desenvolvidos por meio de inovação social na interação entre cientistas, empresa e apicultores, que identificaram as espécies que mais contribuem para a produção de mel, desdobrando-se em:

  • a) Monografias: Espécies apícolas do município de Marcelino Vieira-RN: conhecimento científico e nativo (Sousa Oliveira, 2017). Estratégias de convivência de agricultores familiares no Semiárido brasileiro: um estudo de caso da apicultura no município de Marcelino Vieira-RN (Braga, 2017).
  • b) Dissertação: Percepção etnobotânica dos apicultores do município de Marcelino Vieira-RN-BR (Câmara, 2019).
  • c) Artigos: Estratégias de convivência de agricultores familiares no Semiárido brasileiro: um estudo de caso da apicultura no município de Marcelino Vieira, RN (Braga et al., 2017); A influência da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) na variedade de espécies vegetais da flora apícola em Marcelino Vieira-RN (Pessoa et al., 2017); Percepção etnobotânica associada à apicultura: espécies vegetais com potencial melífero para o Semiárido potiguar, região de Caatinga, Brasil (Câmara et al., 2021).

Sustentabilidade ambiental no desenvolvimento e aplicação do produto/processo/serviço

Devido à atual conjuntura de escassez de recursos para pesquisas, a interação entre instituições e comunidades é estratégica para continuidade das ações na apicultura. O banco de pólens consta na RCPol, rede internacional de pesquisadores, palinotecas, herbários e coleções de abelhas. Com a melhoria do seu portfólio, a Geospace realizou o Inventário Florestal do Piauí, com aporte do Serviço Florestal Brasileiro e Governo Estadual. O levantamento florístico georreferenciado e participativo de interesse apícola em Marcelino Vieira foi premiado como experiência exitosa na II Conferência da Caatinga (Assembleia Legislativa do Ceará, 2018). Modelo semelhante tem sido replicado no Piauí pela Embrapa Meio Norte. Temos participado de eventos como: Encontro de Agronegócios do Sertão do Araripe – ENAGRO (Sebrae, 2018) e Seminários da RCPol (2020) e do Agronordeste (Embrapa, 2021). A entrega de tantos resultados é reflexo da participação dos apicultores na construção da metodologia, que dá sustentabilidade ao modelo. A experiência inovou na abordagem participativa, garantindo igualdade de acesso a tecnologias e troca de informações, cujos resultados se alinham aos ODS 2, 9, 11, 13, 15 e 17.

Colaboradores/coautores:

Cláudia Inês da Silva, José Elton de Melo Nascimento, José Elton de Melo Nascimento, Elisa Pereira Queiroz, Carlos Piffero Câmara, Etho Roberio Medeiros Nascimento, Bruno Nunes Silva, Jailson Silva Machado, Breno Magalhães Freitas, Ortrud Monika Barth, Daniel de Souza Raulino, Carlos Wagner Castelar Pinheiro Maia